quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Uma bomba Jurídica no colo de Sartori





Uma bomba jurídica no colo de Sartori

Constitucional | Publicação em 01.09.15
Arte EV sobre foto Camera Press

Uma jovem advogada gaúcha – Letícia de Souza Furtado (29 de idade, OAB-RS nº 93.308) - ingressou na tarde de hoje (1º) com denúncia de crime de responsabilidade contra o governador José Ivo Sartori (PMDB). A petição foi protocolada na Assembléia Legislativa e é dirigida ao presidente da Casa, deputado Edson Brum. O parlamentar é obrigado constitucionalmente a dar curso ao pedido, para posterior apreciação pelos parlamentares.

Já num dos primeiros parágrafos, a requerente menciona que “em um de seus primeiros atos de governo, reajustou o próprio subsídio; dias depois, ´abdicou´do aumento, privação que, entretanto, não foi levada a cabo, tendo em vista que, na folha de pagamento do mês de junho, é possível constatar que recebeu a remuneração integral e reajustada”.
Mais adiante, Letícia – que se formou pela PUC-RS no 2º semestre de 2013 e atualmente cursa especialização em Direito Público na mesma faculdade - salienta que o aperto financeiro dos ínfimos R$ 600 de salário de agosto não afeta pessoalmente Sartori. Este, como deputado estadual aposentado, recebe o dinheiro de sua aposentadoria na integralidade.
O texto também menciona que “ao suprimir esses valores dos servidores públicos - sobretudo repassando-os em quantia inferior ao salário mínimo que vige - o governador flagrantemente viola direitos sociais daqueles” (...) e “por reflexo, viola os direitos sociais da população à segurança, saúde e educação, previstos no art. 6º da Constituição (...) comportamento que dá azo a greves legítimas promovidas pelos agentes desses setores, e, consequentemente, ficamos todos carentes dos serviços essenciais mencionados”.
Leia a íntegra da petição.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO RS.
Letícia de Souza Furtado, brasileira, advogada, inscrita na OAB/RS sob o nº 93.308, vem respeitosamente perante Vossa Excelência, com fulcro nos arts. 7º, item 9; 9º, itens 4 e 7; 12, itens 2 e 4; 74 e 75 da Lei Federal nº 1.079/50, e arts. 53, inciso IV, e 83 da Constituição Estadual do Rio Grande do Sul, apresentar DENÚNCIA DE CRIME DE RESPONSABILIDADE, em face do GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, o senhor JOSÉ IVO SARTORI, pelas razões de fato e de direito que expõe a seguir:
I – DOS FATOS
José Ivo Sartori, eleito para o cargo de Governador do Estado do Rio Grande do Sul, iniciou seu mandato em 1º de janeiro de 2015. Desde então, vem alegando que as verbas públicas são insuficientes para adimplir todas as obrigações financeiras do Estado.
Em um de seus primeiros atos de governo, reajustou o próprio subsídio ; dias depois, “abdicou” do aumento , privação que, entretanto, não foi levada a cabo, tendo em vista que, na folha de pagamento do mês de junho, é possível constatar que recebeu a remuneração integral e reajustada .
Em julho, determinou o pagamento parcial dos salários dos servidores do Poder Executivo estadual , sendo então compelido, por ordem judicial, a pagar o restante – vide Mandado de Segurança nº 70063956726, julgado pelo Pleno do TJRS; o acórdão frisa o caráter alimentar da verba discutida e a concessão definitiva da segurança.
Nesse interstício, os servidores se uniram para promover greve legítima , e aventou-se a possibilidade de intervenção federal em razão dos atos do Governador.
Agora, novamente, o Sr. Ivo Sartori, no exercício de seu cargo, no que tange à competência de agosto, determinou pagamento parcial do salário dos servidores públicos, com o depósito inicial de apenas R$ 600, valor abaixo do salário mínimo vigente, com promessa de complementação no dia 25 de setembro.
A medida, contudo, não afeta todas as classes de servidores. A alegada autonomia financeira, orçamentária e administrativa de alguns órgãos estatais, em que pese ao menos parte da verba recebida tenha a mesma origem, põe a salvo servidores de outros poderes. Com isso, por exemplo, a aposentadoria do Governador como Deputado Estadual é recebida na integralidade. Também alguns servidores do Poder Executivo, sem que haja critério claro justificante, estão recebendo sua remuneração na íntegra.
Tais atos, conforme demonstraremos, constituem concurso de crimes de responsabilidade.
II – DO DIREITO
Os fatos relatados no item anterior são notórios e vêm sendo amplamente divulgados. Documentos como folhas de pagamentos ficam sob a guarda de órgãos estatais, componentes da estrutura a que pertence, também esta casa Legislativa, razão pela qual o denunciante se abstém de apresentá-los.
De outra sorte, a denúncia envolve tema de interesse público, devendo ser impulsionada mesmo que de ofício.
Por meio de seus atos, o Governador e seus Secretários de Estado praticaram a conduta prevista no art. 7º, item 9, da Lei 1.079/50. Isto porque o salário é verba de caráter alimentar, definido como um direito social pelo art. 7º, inciso IV, combinado com o art. 39, §3º, todos da Constituição Federal.
Ao suprimir esses valores dos servidores públicos, sobretudo repassando-os em quantia inferior ao salário mínimo que vige, o Governador flagrantemente viola direitos sociais daqueles. Por reflexo, viola os direitos sociais da população à segurança, saúde e educação, previstos no art. 6º da Constituição, tendo em vista que o comportamento do Governo dá azo a greves legítimas promovidas pelos agentes desses setores, e, consequentemente, ficamos todos carentes dos serviços essenciais mencionados. Considerando, ainda, que algumas classes de servidores receberam o pagamento integral de seus salários, evidencia-se tratamento desigual, em afronta ao princípio da igualdade, disposto no caput do art. 5º do mesmo texto constitucional.
Pelos motivos recém expostos, os atos do Governador amoldam-se ao disposto no art. 9º, item 4 da Lei 1.079/50. Também se amoldam ao que prevê o item 7 , pois o modo de proceder é incompatível com a honra, decoro e dignidade próprias do cargo ocupado. Alega-se insuficiência de verbas desde o início do mandato; isso, no entanto, não impediu que o chefe do executivo estadual reajustasse o próprio subsídio. Foi dito que se abdicava do aumento; contudo, a folha de pagamento de junho demonstra claramente que o Governador recebeu sua remuneração reajustada e na íntegra.
Ainda que impedido judicialmente de parcelar o salário dos servidores, por uma questão de coerência e idoneidade, deveria suprimir o seu próprio, se a preocupação com as contas do Estado é genuína e legítima. Inclusive porque, uma vez que acumula aposentadoria lograda como Deputado Estadual – cargo pertencente a Poder que não está sendo afetado pelo corte de gastos, sob o fundamento de independência orçamentária –, por certo não passará pelos mesmos percalços que impõe a outros servidores. Assim, o Governador “roga” pela compreensão destes, mas não se cria o mesmo ônus. Não pode exigir sacrifícios desiguais às pessoas – e que não exige a si –, uma vez que, conforme já foi dito, isso viola o princípio da igualdade e o decoro e honra próprios de seu cargo. Impende destacar que o crime de responsabilidade tem natureza político-administrativa. O que está em questão aqui, portanto, é, também, a falta de ética nos atos governamentais, o que se afere por verossimilhança.
Por fim, praticou a conduta prevista no art. 12, itens 2 e 4, da Lei 1.079/50, pois, apesar das reiteradas decisões judiciais que concluem pela inconstitucionalidade do parcelamento – e disso dá-se outro exemplo: Mandado de Segurança 70063866768, julgado pelo Pleno do TJRS –, repetiu o ato, incorrendo em crime contra o cumprimento das decisões judiciárias.
Cumpre salientar que jamais se demonstrou a incidência de qualquer hipótese de exclusão do crime – como estrito cumprimento do dever legal, estado de necessidade ou inexigibilidade de conduta diversa. Pelo contrário, está evidente que o tratamento injusto e ilegal é deliberado, sendo aplicado de forma arbitrária e seletiva.
III – DOS PEDIDOS
Ante o exposto, requer-se o recebimento da denúncia, para que seja processada a julgada nos moldes do art. 75 e seguintes da Lei 1.079/50, combinado com o art. 83 e seguintes da Constituição Estadual do Rio Grande do Sul.
Termos em que pede e espera deferimento.
Porto Alegre, 31 de agosto de 2015.
Letícia de Souza Furtado, advogada (OAB-RS nº 93.308)

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Comentários

Raquel De Los Santos Fidelis - Funcionária Pública Estadual 01.09.15 | 22:07:49
Se ingressarmos com ação coletiva, todos os servidores, temos direito de pedir juros por atraso do pagamento? Parabéns, doutora, pela ação forte contra esse homem, pois em 22 anos de Estado, este é o pior governo.
Lucia Cristina Pereira Santos - Professora Rede Estadual 01.09.15 | 21:44:56
Parabéns pela coragem! A advogada escolheu fazer a diferença, em meio a um Judiciário coberto de privilégios que se cala diante diante de tanta humilhação e desrespeito a direitos básicos como alimentação. São R$ 600,00. Menor que o vale alimentação aprovado para alguns. E distante do auxílio moradia dos magistrados. A signat[aria da ação nos representa neste momento! Obrigada!
Mônica Borges De Araujo - Funcionária Pública Estadual 01.09.15 | 21:28:28
Parabéns a essa jovem advogada. Que tenha êxito em sua denúncia/petição. Esse desgoverno está acabando com o RS, debochando e humilhando o povo gaúcho. E tem cara de pau de mentir que recebeu só R$ 600,00. Que todos abram os olhos e levem até o final, é a única salvação para o nosso amado RS.
Luizinho Miguel Balen - Advogado 01.09.15 | 21:03:10
Parabéns à advogada! Ela expressou a vontade de muitos servidores, e muitos gaúchos. Tomara que dê resultado.
Daniel Guedes Gonçalves - Policial Civil 01.09.15 | 20:31:50
Brilhante iniciativa. Parabens à jovem advogada pelo alto espírito humanitário. Ela é digna de aplausos. Além de tudo isso, outra questão: o ato do governador em nomear sua esposa para um CC com direito à remuneração caracteriza NEPOTISMO (art.20, §5º da Constituição do Estado). Com a denúncia por crime de responsabiidade, vislumbramos uma luz no final do túnel.
Lucia De Fatima Lemos Nogueira - Professora 01.09.15 | 20:29:45
Aplauso à ilustre cidadã, advogada gaúcha. Desta forma legal, ela e o Espaço Vital nos esclarecem sobre leis, das quais ainda somos leigos. Concordo plenamente com tudo, ela tem meu apoio e meu respeito. É exemplo de mulher gaúcha aquela que traz  no sangue a coragem desse povo que luta por seus direitos. Infelizmente hoje nos encontramos à mercê dos nossos politicos, todos mancomunados com o atual governo só pensando em seus beneficios. Pois é: hoje não sei o que pagar (água?luz? cartão de credito?).
Ledi Maria Goulart Gonçalves - Func. Púb. Estad. Aposentada 01.09.15 | 20:05:48
Medida necessária, justa e extremamente oportuna. Parabéns a esta moça pela coragem, determinação, senso de justiça e honradez. Esperamos que o Presidente da Assembléia Legislativa deixe de lado o corporativismo e dê provimento a esta petição mais do que justa.
Jacinto Leite Aquino Rego - Advogado 01.09.15 | 19:39:21
Poxa vida. Tão conceituado é o Espaço Vital no meio jurídico e fica se rebaixando pra divulgar uma aventura jurídica de uma esquerdosa!
Flavio Mansur - Advogado 01.09.15 | 19:18:07
Parabéns à Dra. Letícia. Parcelar salário por absoluta falta de recursos é possível. Não parcelar o dos apaniguados é de uma falta de ética, idoneidade e, porque não dizer, vergonha na cara.
Hugo Skrsypcsak - Advogado 01.09.15 | 19:10:10
A petição desta advogada chega às raias do hilário quanto da inépcia. Mistura o Executivo com o Legislativo, onde diz se originar a aposentadoria do requerido. Confunde as diretrizes orçamentárias. E o mais grave: pede o julgamento, mas não pede nenhuma condenação. Daí que se conclui que é uma estreante e praticante de proselitismo político. A inicial como apresentada, merece indeferimento por carecer de pedido, não bastasse não ter nenhum fundamento jurídico.
Gilberto Luis De Vargas - Corretor De Imóveis 01.09.15 | 18:27:05
Finalmente uma ação competente, direta e clara na direção deste (des)Governo gaúcho. Ante a fragilidade e incompetência e/ou desinteresse do Governo Federal na intervenção direta. Somos hoje, ou até hoje, a verdadeira ´Casa da Mãe Joana´. Enfim uma voz se levanta, em alto e bom tom, lembrando que esta terra "ainda" tem dono. Uma advogada tão jovem(vejam a inscrição dela na OAB), fala pelo povo gaúcho pisado no pescoço por um governinho decidido a entregar o Estado para alguns invisíveis.
Adilson José Brugnara - Advogado 01.09.15 | 18:19:47
É por estas e por tantas outras judicializações (de tudo) que o Estado do Rio Grande do Sul está deste jeito.
Juliano Spall Portela - Advogado 01.09.15 | 18:12:32
Palmas e homenagens a essa colega Gaúcha com "G" maiúsculo! Sou filiado ao PMDB e tenho vergonha desse governo. Estou pensando em pedir minha desfiliação nos próximos dias. Espero que o deputado Edson Brum tenha o compromisso com sua função e dê prosseguimento ao processo. Gostaria de saber que motivo levam esses gestores a descontar toda a incompetência na mola mestra do Estado - que são os servidores públicos.  

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