Atualmente, os golpes de estado são mais sofisticados, por José Luiz Quadros
SEG, 07/03/2016 - 11:36
ATUALIZADO EM 07/03/2016 - 11:38
Enviado por Mogisenio
Gostaria
de aproveitar para reproduzir aqui o texto do grande constitucionalista
mineiro Dr. José Luiz Quadros. Trata-se de uma importante e preocupante
análise do atual momento, digamos, político, econômico e social por
que passa o Brasil inserido num contexto mundial.
Do Blog de José Luiz Quadros
por José Luiz Quadros de Magalhães
Para
o poder econômico, e outros poderes que o sustentam, o importante não é
viver em uma democracia, mas fazer com que as pessoas inocentemente
acreditem viver em uma. O mesmo vale para o Estado constitucional. O que
vemos acontecer de forma grave e agressiva é um teatro, no qual a forma
oculta o conteúdo. Julgamentos, processos, becas, carros de polícia e
ternos e gravatas, parlamentares, jornais, televisão... são um aparato
tragicômico para justificar o desrespeito à vontade popular e o desmonte
de um projeto de transformação social.
Parece
que não há mais espaço para os “golpes de Estado” como na década de
1960 e 1970. Tanques de guerra nas ruas, prisões sem mandado judicial,
torturas escancaradas, parecem não agradar a maioria da opinião pública
do mundo. Os golpes hoje são mais sofisticados. Lembremos que a ditadura
empresarial/militar a partir de 1964 preocupou-se com uma representação
teatral da ditadura com a existência de dois partidos políticos, assim
como fizeram, inclusive, uma Constituição (autoritária e ilegítima) para
reforçar o teatro da “democracia” e “Estado de direito”.
Aquele
teatro mal feito foi aperfeiçoado. A mídia foi tomada e perdeu qualquer
pudor quanto a manipulação, distorção e encobrimento de fatos. Existe
mais tecnologia para encantar as pessoas e o teatro do absurdo é
permanente.
O
golpe em curso no Brasil conta com juízes que agem contra a
Constituição, extrapolando sua função constitucional, investigando,
punindo, agindo como polícia política; promotores e delegados vinculados
a partidos políticos (como no Paraná e São Paulo) que agem ao estilo
dos piores regimes totalitários; e uma mídia que não informa mas faz
campanha aberta contra pessoas, partidos, ideias e instituições.
Este
aparato foi cuidadosamente criado para manter privilégios e para servir
interesses econômicos poderosos. A questão não é corrupção. Claro que
não. A guerra é global e muito pesada. A questão passa pela entrega de
nossas riquezas. A questão é abaixar mais uma vez a nossa cabeça diante
do império do norte. A questão é manter a colonialidade presente em
nosso ser, nossa subordinação ao Europeu e aos EUA. Toda vez que o
Brasil levantou sua cabeça e exerceu sua soberania, o Império nos
colocou para baixo, destruiu nossas lideranças, e continuou saqueando
nossas riquezas. A história se repete com incrível semelhança: Getúlio
Vargas, João Goulart, Lula.
O
mais incrível é a capacidade de levar as pessoas e as Forças Armadas,
acreditarem que a parceria com os Estados Unidos, que entregar o nosso
Petróleo, nosso minério, nossas montanhas, nossa riqueza, pode ser algo a
favor do Brasil. Como que entregar o pré-sal e destruir uma grande
empresa nacional pode ser algo a favor do Brasil? Estamos vivendo, além
de um golpe, uma invasão do país. O projeto é destruir toda
possibilidade de soberania. As pessoas e instituições encarregadas de
proteção da soberania precisam atuar.
Como entender o processo em curso?
Algumas dicas:
1)
Os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) viveram uma
época de grande crescimento econômico enquanto Europa e EUA entraram em
grave crise.
2)
Os BRICS criaram instituições internacionais que permitiriam (e
podem permitir) que estes países, pudessem trilhar um caminho de
soberania econômica independente das potencias que mandam no mundo há
500 anos, desde o início da invasão da América pelos europeus.
3)
Na América Latina foram eleitos governos, nos últimos quinze anos,
que recuperaram a soberania sobre as riquezas nacionais, melhoraram a
vida das pessoas, permitiram o acesso do povo a informação, educação e
saúde. Os dados são da ONU e qualquer pessoa pode acessar no link do
PNUDH. São fatos, e não discursos.
4)
Foram criadas instituições importantes sem a presença dos EUA ou
Europa que permitiriam (permitirão) o desenvolvimento e fortalecimento
da América Latina e Caribe, como a CELAC e UNASUL.
5)
A perspectiva de crescimento do BRICS apresentava-se muito maior e
com perspectivas de crescimento muito superiores ao crescimento da
Europa e EUA.
6) Foi construído o Porto de Muriel em Cuba para facilitar o comércio internacional.
7)
Centenas de Campi Universitários foram criados no Brasil e
Venezuela. A Unesco declarou o fim do analfabetismo na Venezuela e no
Brasil 60 milhões de pessoas mudaram de vida para melhor.
8) A China constrói o Canal da Nicarágua para não depender mais dos EUA e do seu canal do Panamá.
9)
Os governos de esquerda na América Latina se expandem e apresentam
crescimento econômico importante como acontece com a Bolívia.
10) Um novo constitucionalismo plurinacional, plural, diverso e radicalmente democrático surge e cresce no Equador e Bolívia.
11) A esquerda cresce na Europa com o insucesso das políticas neoliberais, o desemprego e desespero crescente.
12)
A presença brasileira e chinesa na África cresce e temos vários
contratos com Sudão, Líbia (o país que tinha o melhor IDH da África
antes das invasão e destruição por parte da OTAN).
Estes
são só alguns fatos. PERGUNTA: SINCERAMENTE, SEM QUALQUER MANIQUEÍSMO,
MAS PERCEBENDO UM MUNDO DE CONCORRÊNCIA DE INTERESSES DENTRO DO SISTEMA
CAPITALISTA, VOCÊS ACHAM QUE EUROPA E EUA ACEITARIAM PERDER A HEGEMONIA
GLOBAL CALADOS?
Resta saber de que lado os golpistas no Brasil estão, e claramente não é do Brasil e do povo.
Qual a resposta dos EUA e EUROPA.
1)
Redução do preço do Barril do Petróleo a níveis muito baixos, o que
inviabiliza ou ao menos dificulta países como Venezuela, Equador,
Rússia, Brasil e o nosso pré-sal.
2) Guerra econômica e desestabilização política no Brasil, Argentina, Venezuela, Rússia entre outros.
3)
Controle da grande mídia antinacional e guerra ideológica diária em
todos os espaços. Reparem que nem em transmissões de futebol a
ideologia e a crítica aos governos populares são poupadas.
4)
Invasão da Líbia e Síria. Invasão da Ucrânia. Desfazimento dos
contratos da Líbia com o Brasil e China, primeiro ato do novo governo da
Líbia apoiado pelos EUA, Inglaterra, França e Espanha.
5) Ideologização e instrumentalização de parte do Judiciário, Ministério Público, Polícia Federal, com ações seletivas.
6)
Encobrimento ideológico de ações políticas de desestabilização por
meio de um falso discurso neutro da luta contra a corrupção.
Em
meio a tudo isto, um grupo de pessoas, perdidas em meio à guerra
ideológica são levadas a ir às ruas contra o Brasil, e os nossos
interesses, empurrados pela desinformação generalizada, a confusão e o
ódio de classe incentivado permanentemente. Triste, perigoso e
interessante é a contaminação das Polícias, que vindo do povo se volta
contra este e contra o país. Interessante como que brasileiros, que se
dizem patriotas, pedem a intervenção militar contra o Brasil.
As
Forças Armadas têm a função constitucional de preservar a soberania.
Jamais poderia intervir para destruir a soberania como querem alguns
poucos desinformados. Estamos sob ataque estrangeiro: a guerra é
ideológica e econômica, e o grande inimigo é a desinformação. A solução é
mais democracia, participação, informação e mobilização, urgente.
*José Luiz Quadros de Magalhães é professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
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