JORNAL FOLHA DA CLASSE
coluna no Globo
A raiz da crise
O governo acabou. No dia de ontem isso ficou muito
claro. O Supremo Tribunal Federal (STF) está definindo o rito do
impeachment, o país perdeu o grau de investimento, a área econômica bate
cabeça, com decisões sobre o Ministério da Fazenda sendo tomadas sem
que o ministro seja ouvido. No Congresso, a oposição é que se mobiliza
para defender o erário.
Pode parecer um mero detalhe, mas é um exemplo desse clima de fim de
governo. A Receita Federal é contra a nova mudança e ampliação do
Simples Nacional. Uma já foi aprovada no ano passado. Entre outras
razões, argumenta que isso significaria perda de R$ 6 bilhões em 2016,
de R$ 12 bilhões em 2017 e R$ 18 bilhões em 2018. Estados e municípios
perderiam de R$ 5 bi a R$ 7 bi por ano. A Receita fez uma nota técnica
mostrando os riscos da mudança, mas o Projeto de Lei Complementar
125/2015 está sendo ardorosamente defendido pelos governistas.
Os senadores do PSDB Aloysio Nunes Ferreira e Cássio Cunha Lima
tentaram barrar o projeto para debatê-lo, mas a bancada do governo o
defende. Quando o senador Aloysio procurou o líder do governo, Paulo
Pimenta, com a nota técnica da Receita, mostrando os argumentos, ele
disse que isso era coisa de “burocrata”. O senador oposicionista disse
que a Fazenda era contra, mas o deputado disse que a Casa Civil era a
favor. Foi aprovado na Câmara.
A área técnica do governo não consegue interlocução com os próprios
governistas. Fatos assim alimentam o pessimismo em relação ao Brasil.
Uma agência, quando analisa o país, olha a tendência de longo prazo. O
Brasil, depois de dois anos com déficit primário, terá uma meta
flexível, que poderá ser zero. Houve mais um espetáculo de
desautorização pública do ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Daqui para diante haverá mais fluxo de capital para os Estados Unidos
e menos interesse em países em desenvolvimento. Ontem os juros
começaram a subir nos Estados Unidos depois de sete anos de juros zero.
Não foi apenas um movimento. Haverá outros. É uma mudança na política
monetária da maior economia do mundo e isso tem reflexos. O Brasil está
na pior situação possível neste momento: sendo rebaixado por agências de
risco.
O rebaixamento pela Fitch era esperado, mas tem efeitos. A partir de
agora o Brasil não é grau de investimento. Os investidores
institucionais exigem duas agências classificando nesse nível para que o
país seja colocado no mapa das inversões. A única nota boa que o país
tem é da Moody’s, mas a agência já comunicou rebaixamento para breve.
Como foi que chegamos até aqui? Com o ataque sistemático e continuado
às bases da Lei de Responsabilidade Fiscal, com o desprezo pelos
fundamentos da estabilidade monetária e fiscal que tem caracterizado a
administração Dilma Rousseff.
A presidente agora deverá enfrentar um rito diferente do que foi
defendido pelo advogado-geral da União no processo de impeachment. O
processo é longo, e ela terá tempo de se defender. Mas do que é acusada a
presidente Dilma? De atentar contra a Lei Orçamentária, de desrespeitar
a Lei de Responsabilidade Fiscal. E ela tem feito exatamente isso,
tanto que o país chega ao fim de cinco anos de seu governo em trapos do
ponto de vista fiscal.
Na nota técnica da Receita Federal contra a nova mudança e ampliação
do Simples — que inclui até empresas de bebidas na renúncia fiscal e
dobra os prazos para pagamentos de dívidas tributárias — um dos
argumentos é que ela fere a Lei de Responsabilidade Fiscal. Só quem se
preocupa com as ponderações dos técnicos do governo é a oposição, porque
os governistas aprovaram o regime de urgência ao projeto sem ouvir o
que a Receita está dizendo.
A ideologia de Dilma é incompatível com a estabilidade monetária e
fiscal. Não foram apenas seis decretos de crédito suplementar. Foi toda a
política implantada por ela. O Brasil perdeu o selo de bom pagador pelo
qual lutou durante anos nos governos Fernando Henrique e no primeiro
mandato de Lula. A vitória foi conquistada passo a passo. A perda é
também o resultado de erros repetidos. Eles começaram no final do
período Lula, mas ganharam vulto na administração Dilma.
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